Desde dezembro de 2019, a Minerva captou ao menos R$ 10,8 bilhões através de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), incorporados a diversos Fiagros. Entre os fundos de investimento agro que adquiriram CRA da Minerva estão:
AAZQ11 e AZQA11 (AZ Quest Investimentos);
BBGO11 (BB Asset Management, do Banco do Brasil);
CPTR11 (Capitania Investimentos);
CRAA11 (Sparta Fundos de Investimento);
AAG11 (Inter Asset);
JGPX11 (JPG Asset Management);
KNCA11 (Kinea Investimentos, do grupo Itaú);
VCRA11 (Vectis Gestão);
XPAG11 e XPCA11 (XP Investimentos).
O dinheiro de um dos CRA, o CORP Minerva VI, foi usado para reembolsar gastos com fornecedores de gado ao longo de dois anos antes do fim da oferta. Parte desses fornecedores têm histórico de desmatamento e estão envolvidos em esquemas de lavagem de gado ilegal, conforme levantamento do Centro para Análise de Crimes Climáticos (CCCA).
Entre os fornecedores, há pecuaristas com embargos do Ibama por desmatamento não autorizado e interessados em impedir a demarcação da Terra Indígena Tanaru.
O senador Jaime Bagattoli (PL-RO), também fornecedor da Minerva, propõe, através do PL 3334/2023, reduzir as áreas de Reserva Legal na Amazônia de 80% para 50%, beneficiando pecuaristas, incluindo ele próprio.
A securitização de dívidas permitiu que os títulos da Minerva fossem estruturados por escritórios da Avenida Faria Lima, em São Paulo. A Virgo, responsável pelas emissões da Minerva, também emitiu CRA para a Vinícola Salton, envolvida em casos de trabalho análogo à escravidão em 2023.
Investir nos títulos da Minerva se tornou acessível a qualquer cidadão com CPF e conta em corretoras. O BTG Pactual distribuiu metade dos CRA da Minerva, promovendo ao mesmo tempo a Amazônia como destino natural para seus clientes.
A Minerva afirmou que "não foram identificados passivos ambientais ou comercialização irregular" em seus fornecedores diretos, admitindo que só rastreará fornecedores indiretos em 2030.
O "CRA Minerva IV" arrecadou R$ 2 bilhões em setembro de 2023, incorporando sete Fiagros e atraindo milhares de investidores. No mercado, os títulos da Minerva são vistos como "high-grade" (alta confiança).
Os irmãos Vilela de Queiroz, principais acionistas da Minerva, lucram de duas formas: recebendo capital para expansão da empresa e pagamentos diretos por fornecer gado ao frigorífico. Entre 2022 e 2023, receberam R$ 30,9 milhões por venda de gado.
Em 2019, um CRA da Minerva coordenado pelo Banco do Brasil envolveu fazendas familiares ligadas a desmatamento em Buritis-RO. A fazenda Água Doce, recebeu gado da Vitória II, que tem 64% da área embargada pelo Ibama.
O desmatamento segue avançando sobre terras indígenas. A fazenda União, em Chupinguaia (RO), foi embargada em 2011 pelo Ibama, mas continua sendo usada para pasto. A propriedade, pertencente à família Mendonça, está sobreposta à Terra Indígena Tanaru, que abrigava o “Índio do Buraco” até sua morte em 2022.
Mesmo com embargos, entre 2018 e 2021, as fazendas União I, II e Tangará enviaram mais de 5.700 bois para a fazenda Califórnia, de Helena Mendonça, legalizando-os para venda. Destes, 1.547 foram para a Minerva, 3.876 para a Marfrig e 187 para a JBS.
De 2022 a 2023, Edson Ribeiro de Mendonça Neto, também herdeiro da Fazenda União, recebeu R$ 30,7 milhões do CRA da Minerva pelo fornecimento de gado.
Os pecuaristas querem extinguir a proteção da Terra Indígena Tanaru, propondo um memorial para o “Índio do Buraco” e requisitando a posse da área. O MPF acusa a Funai de negligência, pois nunca iniciou o processo de demarcação definitiva.
"A Funai cometeu um ato ilícito ao não demarcar essa terra ao longo do tempo. Não existe previsão legal que condicione a demarcação à possibilidade de perpetuação do povo", diz Daniel Dalberto, procurador do MPF.
A investigação mostra como o mercado financeiro está entrelaçado ao desmatamento e lavagem de gado na Amazônia. Com investimentos acessíveis via aplicativos, investidores comuns podem, sem saber, financiar a destruição ambiental. Enquanto isso, grandes frigoríficos e seus herdeiros seguem lucrando na Bolsa de Valores.